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O Mal Estar na Vida Virtual

  • Foto do escritor: Laís Comini
    Laís Comini
  • 31 de mar.
  • 3 min de leitura


O advento das redes sociais trouxe novos contornos ao mal-estar na civilização descrito por Freud. Nesse texto vamos dar ênfase à relação que criamos, enquanto usurários, com o instagram.


O Instagram, enquanto plataforma social e visual, tornou-se um espaço privilegiado para a mercantilização de praticamente todos os aspectos da vida. Ele se insere no contexto de um mercado globalizado, onde produtos, experiências e até mesmo pessoas são transformados em mercadorias. Essa lógica mercadológica está intrinsecamente ligada à forma como o Instagram opera, desde seu design até suas práticas de monetização. Vejamos alguns pontos cruciais nessa relação:


1. O Produto como Identidade

No Instagram, marcas e indivíduos constroem narrativas cuidadosamente curadas para engajar audiências. O feed de uma pessoa não é apenas uma coleção de imagens, como um álbum de fotos, mas uma “marca pessoal”. Dessa forma, até a identidade e a subjetividade se tornam mercadorias consumíveis. O lifestyle que um usuário apresenta – viagens, refeições, fitness – assume o papel de produto, com seguidores como consumidores.


2. Influenciadores e Publicidade Invisível

O papel dos influenciadores é central nessa dinâmica. Eles transformam sua audiência em um mercado potencial para anunciantes. A publicidade, que frequentemente toma a forma de posts orgânicos, torna-se quase invisível, misturando-se ao conteúdo comum. Assim, cada “curtida” ou comentário alimenta o ciclo do mercado, medido em engajamento e conversão.


3. O Consumidor Produtivo

Os próprios usuários não são apenas consumidores, mas também produtores de conteúdo que beneficia o ecossistema do Instagram. O tempo gasto na plataforma, as interações e os dados gerados tornam-se commodities valiosas para anunciantes e para o próprio Instagram. Os dados de comportamento e preferências pessoais são, literalmente, vendidos no mercado digital.

Existe uma frase icónica: se você não está pagando pelo serviço, o mercadoria é você.


4. A Ilusão da Acessibilidade

Ao mesmo tempo, o Instagram promove a ideia de que qualquer pessoa pode participar deste mercado, construindo sua marca pessoal e monetizando sua presença. No entanto, as desigualdades são evidentes: nem todos têm os recursos ou conhecimentos para competir nesse espaço saturado, o que reforça estruturas de poder pré-existentes.


5. A Estética da Mercadoria

Além disso, a estetização de produtos é fundamental. O Instagram não vende apenas coisas; vende desejos, aspirações e estilos de vida. Um simples copo de café pode ser apresentado de forma a sugerir luxo, descanso ou produtividade – valores que transcendem a funcionalidade do objeto e o transformam em símbolo.


Nessas plataformas, em especial o instagram, o desejo humano de reconhecimento e pertencimento encontrou um palco virtual onde somos ao mesmo tempo espectadores e protagonistas. No entanto, esse palco também amplificou a tensão entre o desejo autêntico e a exigência de conformidade às normas sociais, instaurando um novo tipo de vida performática.


Nas redes sociais, a expressão do eu é filtrada por curadoria, edição e comparação.

Perfis pessoais se transformam em vitrines, frequentemente exibindo versões idealizadas de uma vida que pode estar longe da realidade. Esse desempenho constante reforça o mal-estar ao exigir que o sujeito dedique energia não apenas à sobrevivência ou convivência, mas também à manutenção da própria imagem pública.


A vida performática, ao mesmo tempo que satisfaz um desejo inconsciente de aceitação, reforça o recalque de partes autênticas do sujeito que não se encaixam na narrativa que deseja projetar.

Além disso, as redes sociais intensificam o ciclo do desejo e da frustração.

A promessa de conexão e reconhecimento é frequentemente substituída por comparações que alimentam inseguranças e idealizações inalcançáveis.

A exposição ao "sucesso" e à "felicidade" dos outros pode provocar sentimentos de inadequação e, paradoxalmente, aumentar o mal-estar ao invés de diminuí-lo.


Freud nos ensinou que o preço da civilização é a repressão.

Nas redes sociais, essa dinâmica se desdobra: reprimimos não apenas os impulsos que seriam incompatíveis com a convivência, mas também as partes de nós que não atendem ao imperativo de parecer bem-sucedido e feliz.


A psicanálise, nesse contexto, oferece um espaço para o sujeito desconstruir essa vida performática e buscar uma relação mais autêntica consigo mesmo e com o outro. Um desafio e tanto, não é?

Para resumir, as redes sociais não criaram o mal-estar na civilização, mas certamente o ampliaram. Elas oferecem um cenário onde a tensão entre o desejo e a interdição é constantemente reformulada, deixando o sujeito preso em um ciclo performático que, ao invés de liberá-lo, pode aprisioná-lo ainda mais em sua busca por reconhecimento e pertencimento. E você, consegue identificar, dentro dessa teia de influências, o que realmente constitui o seu desejo?

 
 
 

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